PS: Texto de não autoria da dona do blog, publicado como anônimo. Todos os direitos reservados.
Não gosto de várias coisas. Uma delas são os
meus textos pessoais.
Fico com a impressão de que quando coloco meu
coração no teclado e começo a digitar
freneticamente, as orações perdem a abrangência que eu buscava, para que então
um único foco tome conta de todos os parágrafos: eu e minhas histórias, tão
complicadas quanto um cubo de Rubik. Começo a escrever influenciado pelo puro
desejo de exteriorizar o que estou sentindo e sinto derramar-me sobre o texto, apoderando-me e tomando conta dele, do
prólogo ao epílogo, como a água que derramamos aos poucos e vemos espalhar-se
pela superfície, irrefreável.
Não gosto de ser o foco, quando eu mesmo sou o
observador. Quando o meu ponto de vista é o único a analisar toda a situação,
há uma tendência em ser severamente crítico com relação às minhas próprias
atitudes. Também não gosto das minhas histórias complicadas.
E você é a maior delas, sinto informar-lhe e
informar a mim mesmo. É complicado te ver sem que as cenas da nossa história
complicada invadam a minha mente e eu vividamente relembre tudo o que
aconteceu, desde aquele maldito 6 de fevereiro quando aceitei ver aquele filme
com você, sem a menor pretenção de abrir as portas da minha vida para o seu
sorriso bobo e os terríveis olhos de ressaca. Poderia dizer que me arrependo,
se fosse julgar por todas as reviravoltas que nosso perigoso amor estava
destino a enfrentar. Não me pergunte o porquê, até hoje ainda não entendo o que
eu pensava quando nós estávamos juntos, mas aquela sensação de risco calculado
não me deixava em paz, e constantemente achava que o dia em que nos beijamos
pela primeira vez foi o dia em que eu comecei a patinar em gelo fino, sem saber
se a mão que patinava ao meu lado era firme o suficiente para nos segurar, caso
o gelo rachasse.
Fico curioso em saber quando aconteceu. Tudo
pareceu tão rápido, tão de repente que não tive tempo hábil de perceber e
perguntar-me se era assim mesmo que as coisas deveriam ser. A única coisa que
tive tempo de fazer, quando a realidade estapeou a minha cara, foi olhar ao meu
redor e temer o fato de que meu mundo já não seria o mesmo sem você nele. E
esse temor não passou nunca, desde então. Cada dia da nossa vida juntos me
parecia uma vitória e eu celebrava isso intimamente, porque pensava que a
qualquer instante, na velocidade da batida das asas de um beija-flor, eu
estaria por minha própria conta de novo. Se o certo é cuidar do jardim para que
as borboletas cheguem, eu tinha a nítida certeza de que você era a borboleta
mais arisca e não havia flor que fizesse você preso a mim. Não tanto quanto eu
era preso a você. Me envergonho ao lembrar dessas coisas, se quer saber a
verdade. Aos olhos de qualquer cidadão sensato, era possível ver que era eu
quem precisava de ti, e não o inverso, para meu infortúnio.
Mas o tempo foi passando, como é de sua bondosa
natureza. E aos poucos eu fui mergulhando em você, mergulhando na nossa paixão
que causava inveja a quem estava à nossa volta. E a cada centímetro no qual eu
me afundava, esquecia-me de voltar para respirar e me lembrar de que aquilo
podia acabar a qualquer hora. Eu me esqueci disso, e paguei um preço alto. Você
se tornou a minha rotina. Mas não daquelas rotinas cansativas, você era a
rotina que eu gostava de ter, aquela que dava sentido a cada coisa imbecil que
eu fazia no meu dia. Pensar em você era tão natural quanto respirar e eu me
acostumei com o enorme espaço que tão incovenientemente ocupara na minha vida,
sem ao menos ponderar se eu queria. Porém, você não precisava ponderar. Eu
facilitei tanto para nós dois que abriste caminho no meu dia-a-dia sem fazer
grande esforço. Saber que era o seu cheiro que eu ia sentir, que era o seu
sorriso que eu ia ver e era a sua voz que eu ia ouvir quando chegasse o fim de
semana, me deixava mais calmo, quando meus dias eram meio turbulentos. Torná-lo
um hábito foi um erro tão brutal que eu tenho medo de todas as pessoas que
começam a se fazer presentes demais para mim.
Estremeci quando você deixou aquela roupa sua
no meu quarto. Tomei um susto ao perceber que você tinha ido embora lá de casa
com uma camiseta minha. Foi então que eu notei que eu já não tinha distinção de
quando terminava o meu espaço e começava o seu. Nós dois éramos tão únicos que
para mim só exista a circunferência da bolha que nos envolvia. Os perfumes se
misturavam e a junção deles formava o nosso cheiro, mais uma das marcantes
características daquele casal incomum que se tornara inseparável. Eram muitas
manias, muitas piadas, muitos detalhes que escapavam aos olhos de todos.
Eu só tinha amado uma vez, antes de você. Não
tinha muita certeza de que era amor verdadeiro, da mesma forma como hoje não
tenho certeza quanto à veracidade do nosso. Ainda assim arrisquei aquele “eu te
amo” tímido, dito no silêncio da minha cama, que era até então o nosso
santuário inviolável, onde todas as verdades eram contadas sem pudor. Pode ser
que eu estivesse inebriado pela ideia de amar, mas naquele momento me pareceu
sincero o suficiente. Você não respondeu na hora, para consolidar toda a
insegurança que eu sentia desde o dia em que eu fiz o pedido de namoro.
E um dia, depois de várias mentiras, depois de
vários beijos indevidos, depois de várias histórias colaterais, você resolveu
dissolver nosso mundo (àquela altura dos acontecimentos, claramente mais meu do
que seu). Como eu tinha me esquecido de como era sem você, foi difícil e
doloroso substituir o seu espaço. Vários candidatos apareceram, muitos deles
imensamente melhores, e ainda assim, você tinha marcado o seu lugar de maneira
que, tão cedo, eu não conseguiria ocupá-lo.
Hoje em dia não existe mais você. Ainda que
apareça algumas vezes na minha memória ou na minha frente, delicadamente fiz
com que se afastasse. Arrumei um jeito artificial de apagar a sua existência e,
até o momento, ele tem funcionado bem. O amor morreu, a paixão, e tudo o mais
que foi abruptamente arrebentado na nossa história complicada. Não te esqueci,
mas só pelo fato de que não existe uma maneira de não se lembrar de alguém. Mas
esqueci o que é sentir por você, aquilo que outrora eu tinha sentido com todo o
meu ser. O que existe hoje são só os cacos de uma história que, dadas as
circunstâncias, nem temos como dizer se foi de amor, ou de qualquer outra coisa
frágil demais para ser definida.
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